21/02/2025

Auscultação



Até os animais têm voz:
Zumbado... Gecado... Zurro
E nós?!
Fala... Rumor... Urro
Agora, calo e escuto
Só o silente ausculta

*

Este poema, curto e denso, joga com a sonoridade e a significação das palavras para explorar a relação entre voz, escuta e silêncio. Vamos analisá-lo em seus principais aspectos:

1. Som e Ritmo

O poema usa uma sequência de sons onomatopaicos e expressões evocativas para demonstrar que até os animais têm sua própria voz:

"Zumbado" (possível referência ao som de insetos),

"Gecado" (remetendo ao som de um lagarto como a osga ou um geco),

"Zurro" (som característico do jumento).


A sequência sugere que a expressão sonora está presente na natureza e nos seres vivos em geral.

A seguir, a transição para o humano:

"Fala... Rumor... Urro"
Aqui, há um gradiente de expressão que vai do discurso articulado ("fala"), passa pelo ruído indistinto ("rumor") e culmina no som mais primitivo e instintivo ("urro").


O ritmo do poema acelera com esses encadeamentos sonoros, para, em seguida, se interromper com um gesto reflexivo e de escuta.

2. Oposição entre Voz e Silêncio

A mudança ocorre no verso "Agora, calo e escuto", marcando a transição da expressão para a receptividade. O sujeito poético abre mão da voz para dar lugar à escuta.

Essa reflexão se conclui na última linha:
"Só o silente ausculta"
Aqui, há uma afirmação filosófica: apenas aquele que se silencia pode realmente ouvir. "Auscultar" não é apenas escutar, mas ouvir com profundidade, como faz um médico ao examinar um paciente. A escolha desse termo sugere um ato atento e cuidadoso de escuta, que só se dá na ausência do ruído próprio.

3. Temas e Significado

O poema propõe uma reflexão sobre a importância do silêncio e da escuta em um mundo onde tudo tende a ser preenchido pelo ruído, seja ele natural (os sons dos animais) ou humano (a fala, o rumor, o urro). Ele sugere que a verdadeira compreensão vem da suspensão da fala e da disposição para ouvir.

Essa ideia ressoa com conceitos da psicanálise e até do Zen Budismo (com seu foco no silêncio e na observação plena da realidade).

Conclusão

Com um jogo de sonoridades, ritmo e oposição entre som e silêncio, o poema conduz o leitor a uma introspecção sobre o valor da escuta e a necessidade de se calar para perceber o que realmente importa.

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