08/03/2025

Ângulos



Angústia
Angina
Ambas pectoris

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O poema é extremamente conciso, composto por apenas três palavras que se organizam em uma relação de ressonância sonora e semântica. Sua força está na condensação do significado e na evocação de múltiplas camadas de sentido.

Análise:

1. Sonoridade e estrutura minimalista
As palavras iniciam-se com a vogal "A", criando um ritmo fonético que unifica o poema.

O movimento do poema é descendente, partindo de um estado emocional (Angústia), passando para um estado físico (Angina), e culminando em uma localização anatômica (Ambas pectoris).

2. Diálogo entre o psicológico e o somático
Angústia é um termo profundamente psicanalítico e filosófico, relacionado ao sofrimento psíquico, à incerteza e ao mal-estar existencial.

Angina já pertence ao campo médico e remete a uma dor torácica associada ao coração, uma condição clínica que pode estar relacionada ao estresse e à ansiedade.

Ambas pectoris sugere a fusão desses dois estados na região do peito, enfatizando que o sofrimento emocional e o físico são indissociáveis.

3. Ressonância psicanalítica
A psicanálise frequentemente trata da somatização da angústia, ou seja, da maneira como os conflitos psíquicos se expressam no corpo. O poema sintetiza esse conceito com extrema economia verbal, sugerindo que a angústia pode se manifestar fisicamente como dor torácica (angina).

Conclusão:
O poema é um exemplo de síntese poética bem-sucedida. Ele trabalha com a interseção entre mente e corpo, psicanálise e medicina, emoção e fisiologia, tudo isso em apenas três palavras. Sua potência reside na sugestão, na ressonância semântica e na capacidade de abrir um espaço interpretativo vasto a partir de um mínimo de linguagem.

Haveria alguma ressonância com o Zen Budismo? Pensei na interconexão, no Interser...

Sim, o poema pode ser lido à luz do Zen Budismo, especialmente dentro da ideia de interconexão (interser), um conceito fundamental na visão budista da realidade. Algumas possíveis ressonâncias:

1. A unidade entre corpo e mente
No Zen, não há uma separação essencial entre o físico e o mental. A dor emocional (Angústia) e a dor física (Angina) são expressões de uma mesma realidade interdependente. No Ocidente, muitas vezes tratamos essas dimensões separadamente, mas no Zen a mente não pode ser dissociada do corpo – assim como a respiração não pode ser separada do ar.

2. A interdependência dos fenômenos
"Ambas pectoris" pode ser lido como um reconhecimento de que angústia e angina compartilham um mesmo lugar: o peito, o centro vital. Isso lembra a ideia budista de que nada existe isoladamente; a dor emocional e a dor física não são realidades separadas, mas aspectos interligados da existência.

3. A experiência direta do sofrimento
O Zen ensina a não fugir do sofrimento, mas a encará-lo diretamente, com plena atenção (shikantaza, o simples sentar-se). O poema não tenta explicar ou racionalizar a angústia e a angina – apenas as apresenta, nuas e diretas, como são. Essa é a abordagem zen: ver as coisas exatamente como são, sem adornos.

4. O vazio e a impermanência
No Zen, todas as coisas são impermanentes e inter-relacionadas, o que se aproxima da ideia budista de śūnyatā (vacuidade). A angústia não existe em si mesma, nem a angina; ambas surgem a partir de causas e condições. O poema, ao apresentar essas palavras sem uma explicação explícita, sugere essa vacuidade: elas só fazem sentido dentro de uma rede de relações, dentro do próprio leitor que as experimenta.

Conclusão:
O poema pode ser lido como uma expressão concisa da interdependência entre mente e corpo, sofrimento emocional e físico, linguagem e experiência direta. Sua simplicidade e sua forma aberta refletem a estética zen: poucas palavras, vasto espaço interpretativo. Como um koan, ele não dá respostas – apenas aponta para algo que precisa ser vivido para ser compreendido.




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