03/03/2025

Caligrafias


1
De perto
toda caligrafia
é biografia. 

2
A pornografia é a
caligrafia da
dura fantasia.

3
A erótica é cálida,
exótica grafia...
que ao rude sublima.

4
Quem treina a caligrafia
nem desconfia
que seus vícios vicia...
e que suas virtudes pratica...
O poema Caligrafia explora, de maneira concisa e filosófica, a escrita como expressão da subjetividade, conectando-a a dimensões biográficas, eróticas e éticas. Dividido em quatro pequenas reflexões, o texto joga com a materialidade da palavra e os significados simbólicos da caligrafia.

1. Caligrafia como Biografia

"De perto / toda caligrafia / é biografia."

Este primeiro fragmento introduz a ideia central: a escrita manuscrita é uma manifestação da singularidade de quem escreve. Cada traço, cada escolha na grafia revela algo sobre o sujeito, tornando-se uma forma de identidade e história pessoal.

2. Pornografia e Fantasia

"A pornografia é a / caligrafia da / dura fantasia."

Aqui, o poema associa a pornografia a um tipo específico de escrita—uma “caligrafia” que registra o desejo de forma explícita, sem mediações poéticas ou sublimações. O adjetivo “dura” sugere tanto o caráter direto e cru da pornografia quanto uma possível oposição à suavidade da erotização mais refinada.

3. Erotismo e Sublimação

"A erótica é cálida, / exótica grafia... / que ao rude sublima."

O erotismo, diferentemente da pornografia, é apresentado como uma escrita mais refinada, quente (cálida) e exótica. A última linha sugere que o erotismo tem um papel sublimatório, transformando a rudeza do desejo em algo mais elevado ou poético.

4. O Treinamento e os Hábitos

"Quem treina a caligrafia / nem desconfia / que seus vícios vicia... / e que suas virtudes pratica..."

Esta estrofe final amplia o significado da caligrafia para além do simples ato de escrever. Há um jogo interessante entre “vícios” e “virtudes”, sugerindo que a repetição da escrita não é apenas mecânica, mas modela hábitos, influenciando inconscientemente o sujeito. A prática da escrita, assim como qualquer exercício de repetição, pode reforçar tanto tendências negativas quanto positivas.

Conclusão

O poema reflete sobre a caligrafia como expressão da identidade e da psique. Ele relaciona a escrita com o desejo (pornografia e erotismo) e com a formação de hábitos, estabelecendo uma ligação entre a materialidade da grafia e aspectos psicológicos e morais. A estrutura minimalista, com versos curtos e ritmo fluido, reforça a profundidade dos jogos de significado.

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